À revelia da comunidade universitária, a reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) convocou para esta terça-feira (23) uma reunião online extraordinária do Conselho Universitário (Consuni) para a apreciação e aprovação da adesão da universidade à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). Caso aprovada, a gestão de todo o complexo hospitalar da UFRJ, que conta com 9 unidades, passará a ser feita pela empresa pública de direito privado.
A comunidade universitária da UFRJ vem lutando contra a pactuação com a Ebserh e realizará ato em frente à reitoria, no dia da reunião (23), a partir das 9 horas. De acordo com relatos de docentes de outras universidades federais cujos HUs são geridos pela empresa, além de não trazer melhorias, a Ebserh tem interferido na autonomia universitária, especialmente nas práticas de extensão, e precarizado as condições de trabalho, entre outras queixas. O ANDES-SN, através da diretoria nacional e da Regional Rio de Janeiro, tem acompanhado e apoiado a luta na UFRJ.
“Esse método é um atentado à democracia interna, dentro do espírito de ‘passar a boiada’, se aproveitando das dificuldades decorrentes da pandemia. A posição da Reitoria será entregar nossos hospitais ao General. Nós devemos lutar pela autonomia e democracia na UFRJ, principalmente, para UFRJ continuar desempenhando seu papel social junto à sociedade. Precisamos nos mobilizar urgentemente!” afirma a professora Marinalva Oliveira, da Faculdade de Educação e do Movimento Barrar a Ebserh na UFRJ.
A professora da Faculdade de Direito da UFRJ, Luciana Boiteaux, questiona a retomada das tratativas para adesão à Ebserh, que estavam suspensas na universidade desde 2013, por força da luta da comunidade acadêmica. A docente considera esse resgate “um ataque à autonomia universitária”. “Nós estamos no último ano do governo Bolsonaro, e a reitoria quer entregar os nossos hospitais a esse governo genocida? É isso mesmo?”, indaga.
“É necessário desmascarar as alegações de que não há concursos, de que não há financiamento, pois na justiça já há uma ação transitada em julgado, em fase de execução determinando a realização de concursos! Já sem possibilidade de qualquer recurso por parte da União. O que a AGU e a reitoria tem que fazer é demandar a execução dessa decisão judicial, e não nos obrigar, sob pena de chantagem, a contratar uma empresa sem executar essa sentença que nos dá direitos de contratação via serviço público, a princípio contrato temporário para a universidade!”, revela Boiteaux, que também integra o movimento na universidade.
Elizabeth Barbosa, 1ª vice-presidenta da Regional Rio de Janeiro do ANDES-SN, ressalta a importância da organização de docentes, técnicos e estudantes para barrar a entrada da Ebersh na UFRJ e reforça o quão ruim é pautar a adesão à empresa nesse momento político. “Sabemos da importância que foi a nossa luta lá atrás para que a UFRJ não assinasse a adesão ao contrato. Foi uma vitória naquele momento e, nesse momento político, trazer à tona essa adesão de novo, quando temos muito claro, em todo o Brasil, o que significou a gestão da Ebserh nos nossos hospitais universitários é um equívoco”, alerta. A quebra da autonomia, o quanto isso compromete a formação e a assistência dada nos HU, a precarização do trabalho, a perda de direitos são alguns dos exemplos citados por Elizabeth.
“A Ebserh conta residentes como parte de recursos humanos dentro dos hospitais para dizer que aumentou o número de profissionais. É muito importante que a gente intensifique e apoie a luta para que a Ebserh não se instale UFRJ. Essa semana é decisiva porque a reitoria começa a pautar no Consuni os termos do contrato. Se não conseguirmos fazer esse movimento de barrar a adesão, teremos uma perda profunda, pois na UFRJ são 9 unidades no complexo hospitalar. O ANDES-SN tem um papel fundamental nesse processo. Pela Regional Rio de Janeiro temos apoiado muito essa luta, assim como nacionalmente”, acrescenta.
A presidenta do Sindicato Nacional, Rivânia Moura, também ressalta a importância de resgatar a luta histórica da comunidade acadêmica da UFRJ que, em 2013, conseguiu barrar a implementação da Ebserh na UFRJ. “Importante dizer que foi a união das categorias que conseguiu fazer com que esse projeto não adentrasse a estrutura dos hospitais universitários da UFRJ, embora vários outros HUs no Brasil tenham aderido à essa gestão privada dos hospitais, que tem impacto na autonomia universitária”, afirma.
Rivânia explica que quando a gestão dos hospitais passa a ser da empresa, mesmo que estatal, deixa de ter a participação da comunidade acadêmica. “Isso é um fato muito grave, porque é mais uma afronta à autonomia nesse contexto de inúmeros ataques que temos sofrido. Tem também um impacto enorme na contratação de pessoal, que deixa de ser através de concurso público e passa para uma lógica de gestão privada”, reforça.
A presidenta do ANDES-SN considera, ainda, absurdo o fato da discussão sobre a adesão à empresa ser pautada em um momento da pandemia em que os próprios HU cumpriram, e cumprem, papel muito importante, não só no combate à pandemia, mas também no atendimento à população como serviço público de qualidade.
“É muito grave, ainda mais num momento de pandemia, entregar um dos maiores complexos de hospitais universitários para ser administrado por uma empresa, que hoje tem à frente um general no seu comando. Ou seja, está a serviço dessa política nefasta do governo Bolsonaro”, destaca.
Rivânia lembra que a Ebserh foi incluída na lista elaborada pelo ministério da Economia em 2020 de empresas públicas possíveis de privatização. “É muito sério que a discussão tenha retornado agora e que esteja sendo feita no Conselho Universitário como algo que é importante e benéfico para a população e para a própria universidade, que é abrir mão da sua autonomia, que é abrir mão de um complexo hospitalar tão importante como esse da UFRJ. Esperamos que o Conselho Universitário entenda importância desses hospitais serem geridos pela universidade e a importância da preservação da autonomia na gestão desses hospitais”, ”, acrescenta.
Para barrar a Ebserh na UFRJ
Para organizar a luta contra a adesão da universidade à Ebserh, a comunidade se uniu no “Movimento Barrar a Ebserh na UFRJ”. Desde agosto, docentes, técnicos, técnicas e estudantes têm realizado protestos, debates, audiências públicas e articulação com parlamentares do Rio de Janeiro para ampliar a discussão acerca dos impactos que a adesão à Ebserh pode ter para a universidade, seu corpo acadêmico e para a parcela da sociedade que utiliza dos serviços oferecidos pelos HU’s.
Além disso, o movimento desenvolveu uma campanha que tem divulgado materiais nas redes sociais com depoimentos de docentes, técnicos, técnicas e estudantes de outras instituições que aderiram à Ebserh, sobre os resultados da gestão da empresa nos hospitais universitários. As falas denunciam os vários problemas que essas comunidades vêm enfrentando como, por exemplo, descumprimento por parte da empresa dos termos acordados nos contratos de gestão, que dizem respeito a pessoal e às metas de ampliação de infraestrutura.
A presidenta do ANDES-SN reafirma a importância da organização da comunidade acadêmica na luta contra a adesão da UFRJ à Ebserh. “Saudamos o Movimento Barrar a Ebserh na UFRJ, movimento que tem conseguido trazer à tona o debate e torna-lo mais público, e também fazer o enfrentamento a essa proposta e a sua discussão no próprio conselho universitário, num momento de pandemia. O movimento tem bravamente questionado a retomada do debate sobre a Ebserh na UFRJ, feito o enfrentamento e organizado a resistência. É uma pena que a comunidade universitária da UFRJ, que esteve tão aguerrida em 2013 para barrar essa proposta, hoje não se encontre na mesma condição”, afirma Rivânia.
Realidade com a Ebserh
Um dos exemplos é a entrega do Hospital Universitário da Federal do Maranhão (HUUFMA) para a Ebserh, que representou a ruptura da autonomia universitária e o distanciamento entre as atividades acadêmicas e assistenciais, de acordo com relado do professor da Faculdade de Medicina da Ufma, Antonio Gonçalves. Na Ufma, o hospital passou a ser apenas mais um cenário de prática, como qualquer outro, e deixou de ser um hospital Escola Universitário, que permita ampliar o ensino e aprendizagem de estudantes das áreas da Saúde.
“Ainda há tempo de reverter, e o caminho é pela busca do financiamento pelo fundo público. Estou certo de que as universidades são capazes de gerir os seus complexos hospitalares, ainda mais a maior Universidade do Brasil, que é a Universidade Federal do Rio de Janeiro. Eu faço esse alerta com intuito de sensibilizar a comunidade para não entregar o seu complexo hospitalar à Ebserh, que é um caminho sem volta e de destruição do nosso Sistema de Saúde”, conta Gonçalves.
No InformANDES de outubro desse ano, o Sindicato Nacional publicou uma matéria sobre os riscos da UFRJ ceder para a Ebserh a gestão do seu complexo hospitalar, com depoimento de docentes de outras universidades, relatando suas experiências. Leia aqui.
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Fonte:ANDES-SN – Publicado em 22 de Novembro de 2021 às 17h00